Dia Internacional da Mulher

        O dia 8 de março foi designado pela Organização das Nações Unidas como o Dia Internacional da Mulher  com o propósito de lembrar as conquistas sociais, políticas e econômicas das mulheres. Observá-las até aqui é importante para reconhecer aquelas e aqueles que trabalharam para que a mulher pudesse adquirir voz. Porém, é também fundamental escutar que há ainda uma força que tenta silenciar o feminino. 

            Há pouco mais de um século, as mulheres não tinham direito ao voto; quando viúvas, ficavam escondidas em uma platéia próprias para aquelas que precisavam se tornar invisíveis nos teatros, não tinham acesso à leitura, não tinham acesso a um ofício além do âmbito doméstico. Enfim, elas não tinham lugar na vida pública e eram apenas coadjuvantes em um espaço privado.
            Admirar alguém abre espaço para a identificação e para a inspiração. O amor a alguém, quando alicerçado na impossibilidade de não conseguir ser  o que se pretendia como identidade, contempla uma maneira peculiar de amar, pois se dá em conformidade, não raramente, com um espelho quebrado. Alguém pode admirar um filho por aquela pessoa diferente e especial que ele foi se tornando ou alguém pode amar um filho porque ele realiza o que um dia não foi realizado pelos pais. Nesse segundo exemplo, há uma sombra relacionada à mágoa de um ideal não atingido.
            A melancolia, ou seja, o luto que não conseguiu ser terminado, se desenvolve, algumas vezes, como uma casca de uma ferida aberta pela perda de um amor voltado àqueles que não apenas foram admirados, mas por aquelas situações que produziram, de maneira inconsciente, uma inveja não elaborada. Quando esta acontece, o processo de cicatrização não acontece, pois a autoestima é atingida.
          
Sala de Leitura Real Portuguesa no Rio de Janeiro,
publicado em 14 Bibliotecas que Adoraríamos Ficar Presa
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  Nesse início de milênio, ao refletimos sobre as conquistas das mulheres, sentimos a necessidade de nos perguntar sobre como está sendo realizado o luto por aquilo que não conquistamos no passado, para que os espaços possam ser ocupados sem um ressentimento com o que não realizaram, a fim de que cada uma possa preservar a sua autoestima.
 Não basta que uma voz seja alta para que possa ser a  mais ouvida, mas que consiga chegar mais longe porque provoca a admiração e a identificação com o conteúdo do que é pronunciado.
            A mulher que foi ou ainda precisa ser libertada do silêncio e de posições submetidas à violência só encontra o prazer com o seu novo espaço de interlocultora, se não estiver querendo ocupar um lugar que não viveu antes: o lugar daqueles que se utilizaram apenas de sua condição para oprimir os demais. A autoestima feminina não fica abalada em seus alicerces quando a sua história calada transforma, de fato, em passado, uma definição de subjetividade a partir da circunstância ou do limite de território onde alguém deve viver. O mundo é grande para aqueles que traçam seus projetos movidos pelo desejo de não esquecer os acontecimentos a fim de não repeti-los, apenas impulsionados pela ânsia por encobri-los. Que todos os dias sejam dias mundiais onde possamos não apenas lembrar de conquistas, mas contar a história como registros do que realmente ficou para trás e não tem mais possibilidade de ser  revivido.

Simone Engbrecht - psicanalista


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