Sem ilusão, os sonhos ganham força ao acordar
Os sonhos
guardam o nosso sono, porém, somente acordados, podemos realizá-los de fato. Recordamos
dessa formulação psicanalítica ao assistir a uma entrevista com Charles Watson[i].
Ele pontua também uma outra questão fundamental que nos parece estar ligada aos
desejos vividos em experiência: é mais
fácil estarmos disponíveis a novas ideias do que a abandonarmos as velhas.
Não se executa uma sem a outra. A fim de despertar para a vida, os sonhos devem
seguir como desejos e não como ilusões, portanto, devemos abrir mão de antigas
formulações.
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Foto: Reprodução |
É comum
alguém localizar em um episódio recente como sendo a causa de um sofrimento.
Isso ocorre, porque as situações atuais são mais maleáveis e plásticas e essa é
geralmente a expectativa: que algo modifique, sem uma transformação pessoal. Descobrir que um fato recente apenas
desencadeou uma dor, mas que a sua causa está num passado imutável, faz com que
cada pessoa desperte para os seus sonhos em vigília, ou seja, consciente de que
é preciso a sua atitude para que eles possam ser cumpridos.
O nosso passado é muito mais complexo que a nossa ideia de
futuro, pois investimos nossa energia para construí-lo ou, ao menos, para manter
cada milímetro de nossa existência. É natural termos uma impressão de que se
algo que percebemos hoje desestabiliza uma crença e nos protegermos disso. Não
é raro uma pessoa não ser entendida, quando não consegue deixar para trás um
vínculo com algum ideal, pessoa ou condição: é difícil para ela acordar.
As ilusões somente podem ser deixadas para trás quando não se abre mão da esperança que convivia com ela.
Decepções amorosas, separações podem ser concluídas e abrirem espaço para o
novo quando as novidades do tempo nos apresentam uma contradição com as
percepções anteriores.
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Percebermos
nossos próprios enganos não é humilhante quando somos humildes a reconhecer que
não enxergávamos algumas coisas. A disposição para despertar implica em
observarmos os desejos que produziram sonhos e nos apropriarmos dele e da
esperança com os desafios da realidade descoberta. Descobrir significa retirar
a cobertura de aparência que nos impede de despertar para a vida. Nossos
desejos são mais fortes quando adquirem esperança sem ilusões.
Simone Engbrecht - psicanalista