Arrogância e Autoestima
A expressão: ‘Fulana se acha’
pode indicar que essa pessoa possui uma boa autoestima ou que é arrogante. Alguém
pode ‘se achar’ por se encontrar em sua identidade ou por ‘se achar’ melhor que
os outros. A linha tênue que separa a arrogância da autoestima está na
autonomia.
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Foto: Reprodução |
As mulheres, somente a partir dos anos 70 no Brasil,
obtiveram, por exemplo, independência de crédito. Isso indica o quanto a confiança
nelas em relação ao pagamento de qualquer dívida estava ausente na cultura
dessa época. Ter conquistado independência foi fundamental para o
desenvolvimento de mulheres enquanto sujeitos responsáveis por si mesmas.
Porém, a autoestima de muitas mulheres ainda não modificou como gostariam.
A
independência adquirida pelas mulheres pode ser comparada a uma abolição
escravagista na lei. Porém, a autonomia só é alcançada com o reconhecimento na
cultura de seu valor e isso é um trabalho no interior de cada um.
As mulheres, que acreditam ainda que o sentido de sua
existência possa ser construído, responsabilizando aos homens por tudo o que acontece ou não em sua vida, alicerçaram a sua
autoestima em um terreno fora de sua propriedade. A propriedade feminina
necessita estar dentro de cada uma, ou seja, no entusiasmo com a vida como ela
é. Com ou sem reveses. Tanto alguém que coloca as feridas de sua existência
como provocadas pelos acontecimentos, como aqueles que acreditam que
construirão o seu entusiasmo, através de aquisições e atributos externos, não
apoiaram o seu empreendimento de vida em terreno sólido.
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Foto: Reprodução |
Diga-me com quem andas
que eu te direi quem és: Muitos levaram essa afirmativa como a maneira de
construir a sua identidade. Porém, o consumo, os bens, e os acompanhantes de
uma pessoa em uma jornada que visa representar uma vida de sucesso não
sustentam uma autoestima construída em autonomia. Alguém acreditar que ser portador de uma bolsa de grife ou ter publicado uma imagem ao lado de alguém famoso lhe sustentará em uma segurança de reconhecimento é sinal de que está tentando alimentar o seu
valor com um atributo externo.
Hoje, percebemos no cotidiano muitas pessoas
ansiosas por preencher seu tempo de lazer com ‘institucionalizações de
alegria’. Denominamos assim o desejo de distração com grupos, com festas ou com
eventos marcados por ocorrências na agenda. É como se o tempo de vida de alguns
necessitasse estar programado pela arquitetura de acontecimentos. Agora é Natal
e todos reúnem a família, agora é feriado de carnaval e todos viajam, agora é
verão e todos vão para praia, agora todos irão à festa X. Muito triste, pois a
vida não está programada de dentro para fora e sim de fora para dentro. Se
alguém adoece no Natal, necessitará passar dias hospitalizado, não estará
preocupado se as bolas do pinheiro combinam com a toalha. Se alguém está em um
momento de travessia, de mudança, não está ocupado se o comprimento da
camiseta que é adequado. A vida tem sentido quando damos sentido a ela. Isso
parece básico para autoestima, mas nem tudo o que é básico é simples.
A
arrogância é uma tentativa de aquisição de uma capa protetora para uma ausência
de autoestima. O esforço para obtenção de admiração através da destrutividade do valor alheio será sempre um
caminho fracassado. Pois, na medida em que o tempo passa, a autoestima se
alimenta da autonomia presente apenas em um encontro fundamental: o de
cada um com aquilo que construiu com a vida de laços.
Simone Engbrecht - psicanalista