Uma Mudança Não Consiste Apenas Em Uma Tomada de Decisão



“Quando a dor de não estar vivendo for maior que o medo da mudança, a pessoa muda” Sigmund Freud

            Mudanças que envolvem as transformações de idéias em atitudes não consistem apenas em deslocamentos de pontos de vista racionais e decisórios. Mudar não é nada simples, pois implica na dissolução de  resistências relativas a permanência de costumes antigos. Muitas pessoas tomam decisões importantes a cada começo de ano, de semana, de nova carreira, de um relacionamento, de um emprego diferente. Porém, para que as resoluções referentes a novos hábitos  sejam efetivadas, uma modificação mais profunda faz-se necessária.
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            Algumas pessoas sentem uma ansiedade e, com freqüência, se agridem, comendo em quantidade excessiva ou sem qualidade, por exemplo. Sabem que estão ansiosas, mas desconhecem o que existe entre  a ansiedade e um comportamento sem controle. O número de pessoas que estão acima do peso e com dificuldades somáticas em decorrência disso tem aumentado no Brasil. Hoje mais da metade da população brasileira encontra-se com sobrepeso. Não é raro que a ansiedade esteja associada a isso, tanto como causa quanto em conseqüência dessa característica. O preconceito em relação a quem sofre para emagrecer é grande, não apenas por sua aparência, mas em função de muitos acreditarem que  aquelas pessoas que não conseguem cuidar de si, não o fazem em função de não serem suficientemente fortes para dominarem os seus atos. Esse  é um grande preconceito.
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            A frase de Sigmund Freud citada acima: quando a dor de não estar vivendo for maior que o medo da mudança, a pessoa muda, merece uma reflexão no que diz respeito a dor de não estar vivendo, a fim de nos aprofundarmos em conceitos e não apenas sermos prisioneiros de preconceitos. Ele descobriu que a dor e o sofrimento das pessoas podem ser mal interpretados por elas mesmas. E isso se refere, não apenas a dores  sentidas estranhamente como prazeres, mas,  principalmente, a dores deslocadas para alguns sintomas com a finalidade de não serem  associadas ao que causou inicialmente uma ferida. Nesse segundo caso, o indivíduo não possui consciência do motivo do seu sofrimento; o que parece doer é apenas a ponta de um iceberg. A mudança, assim, encontra resistência porque ela está ancorada no medo de algo que um dia tornou-se inconsciente, porque a pessoa não conseguiu administrá-la em função de uma fragilidade num momento do passado. O pai da psicanálise conseguiu escutar que uma dor que não consegue ser elaborada no momento pode acarretar numa fuga que provoca uma outra dor com um colorido diferente. A dor que se tenta esquecer se transforma em um angústia modificada. Como cantava Renato Russo: “toda dor vem do desejo de não sentirmos dor”.
            A angústia é um sofrimento que aponta para uma parte visível, como o que se vislumbra em um iceberg: seu topo. A mudança consiste em descobrirmos o que está encoberto e submerso. O medo relativo a essa tomada de consciência deixa uma pessoa capturada por ele e  vivendo de maneira defensiva,  repetitiva e até mesmo desconfiada.
Quando descobrimos qual é mesmo o medo que impede uma mudança ele se torna menor do que a dor de não estarmos sendo senhores de nossa vida. A ansiedade é facilmente deslocável e confunde quem a sente.  Cuidar de si envolve sempre resistência a sair da repetição.  Enfrentá-la depende de nos acompanharmos por quem possui essa dimensão a fim de conseguir auxiliar de maneira empática. Porém, antes disso, é fundamental cada um solidarizar-se com seu sofrimento, sem vitimizar-se, mas  inquietar-se com o que apenas parece ser a causa dele e, então,  possuir curiosidade para descobrir mais a respeito de seus entraves para uma mudança.

Simone Engbrecht- psicanalista



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