A angústia de um futuro imprevisível


Estamos vivendo um momento de susto, de angústia e, até mesmo, de banalização do medo diante de tanta incerteza em relação ao futuro da sociedade. A reflexão aqui proposta pretende relacionar a falta de referência em termos de previsibilidade de futuro  ao momento de insegurança mundial.
Os humanos possuem uma pulsão denominada em Psicanálise de domínio responsável por nossa atividade diante do mundo. Essa força dentro de nós é responsável pelo prazer de uma conquista de aprendizagem, amorosa ou  da sensação boa quando uma decisão é tomada diante de vários desejos contraditórios contidos em nós. Essa energia, sem prazer de conquista, mas apenas por necessidade de alívio pode se descarregar em forma de crueldade, como acontece  com a necessidade de ganância seduzida pelo poder econômico que parece ter uma força destrutiva indescritível.
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Quando as visões de mundo pareciam mais constantes, o futuro parecia mais previsível. Há uns anos atrás, bastava apenas casar para se ter a impressão de que iria viver com aquela pessoa até o fim da vida, bastava apenas estudar e ser obediente a algumas regras para conquistar um crescimento profissional. Apesar do domínio em relação ao futuro ser sempre utópico, a sensação de uma conquista de território através da visão de referências passadas era realizada. Como num jogo de quebra-cabeça sendo construído, quanto mais encaixes, mais torna-se simples possuir um visão do todo. Nesse momento, quando nada parece se encaixar, a nossa tendência ao domínio pode teimar em buscar uma maneira destrutiva de se fazer presente: um perigo diante da incerteza constante, pois ficamos atordoados. A angústia pode virar desespero e desesperança quando a crueldade presente em cada um não for acalmada.
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 O termo princípio possui um sentido interessante, pois é tanto o início de algo, quanto os valores abstratos de alguém, quando dizemos que alguém é movido pelos seus princípios. Parece fundamental hoje, não perdermos essa diferença, pois ela marca que moral e ética não são a mesma coisa. Se a tendência ao domínio buscar o passado como um ponto de referência como um tempo de começo vivido, onde regras morais eram outras, para compreender o futuro, seguirá em fracasso de não encaixe de peças e isso abrirá espaço para a vocação ao domínio através da força. Por isso, priorizemos o segundo significado de princípio nesse momento.
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Em momentos de transição, como o que acreditamos estar vivendo, faz-se necessário recorrer aos nossos princípios enquanto valores, não como passados vividos, mas enquanto legado do que é construtivo. A herança amorosa pode ser um princípio interessante como alicerce de uma nova construção. Sem pressa e com paciência a reconhecermos que não estamos entendendo ainda do que se passa, pois todas as peças parecem novas. Hoje talvez os elementos estranhos no cenário não podem mais se encaixar, mas podem ainda se ligar, se as nossas interrogações se tornarem mais complexas, ou seja, se não  procurarem mais uma previsão de futuro, mas uma compreensão do momento presente.  Controlando a nossa necessidade de certezas radicais, nos apoiemos nos vínculos amorosos e nas identificações com aqueles que possuem atitudes baseadas no amor à vida ética. Esse é um momento de sobrevivência do que almejarmos não destruir, é necessário que cada um se interrogue sobre quais são, portanto, as raízes de suas atitudes.
Simone Engbrecht- psicanalista


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