Sala de espera


         A indústria do entretenimento se desenvolveu alicerçada no conceito de que o prazer acontece na distração.  Distraídos do quê? Talvez da angústia de não estar vivendo. De maneira genial, a banda Titãs possui uma canção chamada Epitáfio, cujo refrão é o acaso vai  me proteger enquanto eu andar distraído.  O prazer de viver escreve a história no presente, já a distração escreve na lápide o que poderia ter sido vivido. Quando a vida se torna um ensaio para o momento seguinte, devemos lembrar que ele é a morte. Cabe refletirmos, então, se estamos experimentando a morte ou vivenciando a vida.
Foto: Reprodução
Salas de espera são projetadas para tornar confortável um momento que antecede uma consulta de saúde ou uma resposta a respeito de uma cirurgia de alguém querido. Hoje, até mesmo, os bancos e as oficinas de carros, construíram espaços semelhantes para que a angústia dos clientes diante do que não é imediato possa ser suportada.  Como esses ambientes contemplam o auxílio na aquisição de paciência, oferecem recursos para distração: revistas, televisores, água, algumas vezes, até café.
            Hoje, a tolerância com a espera é tão pequena que até o comércio oferece distrações a quem está numa fila para realizar um pagamento. Contraditoriamente ou não, a vida de muitas pessoas se tornou uma grande sala de espera. Muitos aguardam o futuro para que a sua vida faça sentido e tenha graça, outros nem percebem que deixaram de realizar projetos e apenas tentam se distrair para não perceberem essa falta.
Projeto de sala de espera publicado no blog da Viva Decora
            Então, não é contraditório a falta de paciência, por um lado, e a vida transformada em sala de espera, por outro. Esses são os dois lados da mesma moeda, a ausência de si dentro do corpo vivo. Os nossos desejos nos movem a possuirmos coragem para enfrentar as frustrações que fazem parte de um projeto maior. Quando temos claro que a espera está apoiada na esperança relacionada ao que realizamos hoje, não olhamos para o futuro para fugir do presente. Não é necessário fugir do presente se escutarmos a música acima citada queria ter aceitado a vida como ela é, e nos questionarmos se desejamos retirar o tempo do verbo querer do pretérito, não esquecendo que estamos vivos.  Lembremos disso, sem distrações.
Simone Engbrecht - psicanalista

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