Filhos a gente cria pro mundo
Filhos
a gente cria para o mundo: frase clichê dita pelos pais ao perceberem que os filhos
estão crescendo. Pontuamos, porém, que mais do que pertencer ao mundo, cada um
deve pertencer a si mesmo. Esse talvez seja o ponto mais complexo em ser pai ou
mãe, a compreensão de que pertencer a si
significa, ao mesmo tempo, ter responsabilidade e aceitar a sua impotência
diante do mundo. Algo que somente os seres adultos maduros alcançam.
Foto: Reprodução |
Tornar-se pai ou mãe constitui uma felicidade com a
responsabilidade da descoberta muito bem misturada com a visão de impotência diante
do mundo. A maturidade traz essa satisfação: a percepção que o nosso desamparo diante
da vida nos fortalece para agirmos com coragem diante dos riscos. A
identificação dos pais com a conquista de autonomia dos filhos ao aprender a
caminhar e a falar, a seguir sozinho, é grande, pois permite a sensação de que
eles não dependem apenas de quem os gerou, mas sabem voar e por isso estão
sujeitos a quedas. Os desprazeres na vida dos filhos construirão as suas asas e
os fortalecerão para se levantarem após caírem. Os pais são aqueles que confiam
na força dos filhos para suportarem os momentos desafiadores, sem apenas
aplaudirem o sucesso, mas se identificarem com a sua coragem.
Foto: Reprodução |
Os filhos
não sabem voar quando conseguem abrir as asas e viverem no mundo, mas quando reconhecem o seu tamanho diante do inesperado. Perceber a sua pequenez sem
humilhação, mas com humildade, transforma-os em pessoas bem protegidas.
Admiramos os pais que não criam filhos para o mundo, para servir a
esse, mas para a viver a vida como ela se apresenta. Assim como ficar adulto é maravilhoso, pois a responsabilidade por si é libertadora, envelhecer também é ótimo, pois se possui a oportunidade de observar a vida sob o ponto de vista da maturidade necessária para não se aprisionar à realidade. Experimentar com leveza ser pai e mãe de filhos adultos é uma aquisição somente para os maduros que apreciam o sabor de abrir as asas para voar sozinho. Então conseguem compreender a alegria da independência e saber deixar alguém amar.
Simone Engbrecht - psicanalista
[i]
Herbert Vianna – líder da banda Paralamas do Sucesso, cantor e compositor.
[ii]
Saber deixar – expressão trabalhada por Jacques Derrida (1930-2004), filósofo
francês que trabalhou com a complexidade da associação desses dois verbos e com
a sua desconstrução, seu tema de
estudo.