As mudanças acontecem por amor e não por dor
Na vida cotidiana, muitos acreditam que a dor faz com que as
pessoas mudem. Como ouvimos: a dor ensina a gemer. Pode ser, mas gritar de dor
pode não adiantar nada, quando as mudanças necessitam acontecer dentro de cada
um. Em psicanálise, os estudos sobre as mudanças foram mostrando que não é a
dor que modifica alguém, mas o amor.
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Nos últimos dez anos de sua vida, Freud dedicou-se a
escrever sobre a busca da felicidade plena através de ilusões fanáticas e
apresentou o Amor como sendo uma das possibilidades de mudança onde a pessoa
toma consciência de seus ideais e os diferencia de suas idealizações.
É claro que esse nosso presente escrito vislumbra é somente
a ponta de um imenso iceberg. Porém, ele se propõe a inquietar aqueles que se
acomodam inconscientemente[iv]
a situações dolorosas, pois existe no interior de cada psiquismo uma tendência à compulsão a repetir, expressão da a destrutividade relacionada a pulsão de
morte. A dor ativa uma necessidade de acomodação e
repetições de antigos caminhos.
A psicanálise não se propõe a sugestões, pois os conselhos
reforçam aqueles que estejam em uma repetição destrutiva a procurar um alívio através
das certezas alheias e deixarem de valorizar o amor que existe dentro de si,
responsável pela saída do lugar comum. O que é cotidiano, cômodo, repetido,
precisa ser olhado com estranhamento[v]
a fim de que o benefício da dúvida possa se manifestar e a radicalidade
expressa numa fuga da dor possa ser suplantada pelas incertezas do amor gerador de uma curiosidade.
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A curiosidade produz mudança. Aqui salientamos que estamos
falando no interesse diante mesmo daqueles conhecidos há muito tempo, sobre
os seus pensamentos, sentimentos e, principalmente, valores. O amor movimenta tudo isso, já não
ocorre o mesmo com as paixões. Essas últimas observam os atributos de alguém, suas
características, seu comportamento, ou seja, aquilo que necessitam para um alívio
e para não transformarem o seu universo interior. A arrogância decorrente de
uma falta de curiosidade pretende uma defesa diante da dor, mas não alcança uma proteção.
Como afirma Fernando Pessoa: “tudo quanto vive, vive porque muda”. Podemos sobreviver às
dificuldades, mas para viver, é preciso mudar por amor. Feliz 2019.
Simone Engbrecht -
psicanalista
[i] Estudos
sobre histeria, publicado em 1895.
[ii] Além
do princípio do prazer, publicado em 1920.
[iii] Transferência- processo de desejos
inconscientes que se atualizam na relação analítica.
[iv] Inconscientemente- sem consciência de um
querer.
[v] Unheimliche – é um termo utilizado por
Freud para marcar que há algo sinistro, algumas vezes, envolto em uma capa de
familiaridade.