Imaturos como frutas amadurecidas para venda


Amadurecer sem endurecer ou apenas adquirir uma falsa aparência de delicadeza não é simples. Há bem pouco tempo atrás, durante quase três quartos do século passado, a vida seguia mais ou menos da mesma maneira no que dizia respeito à passagem do tempo para as pessoas. Quem não casasse ou não tivesse filhos, não constituísse família, ficava à margem em uma sociedade que considerava este o formato principal de ingresso no mundo adulto. Novas maneiras de seguir a vida foram se abrindo, algumas inclusive semelhantes às antigas. Elas também tornaram possível novas roupagens para a falta de maturidade de algumas pessoas, pois nunca nos referimos tanto ao envelhecer como não sendo um sinônimo de amadurecimento.
Foto: Reprodução
         Não basta alguém sustentar financeiramente uma família para conquistar a maturidade necessária a fim de conseguir ocupar-se de verdade com o que transmite a prole além de bens materiais e muitas recomendações alicerçadas na desconfiança. Não basta alguém morar sozinho para sustentar de fato a capacidade de estar só, ou seja, a responsabilidade em suportar as suas próprias fragilidades. Não basta alguém passar por muitos relacionamentos para ter realmente ter experimentado se vincular e se separar.
         A cultura retarda ou impede o amadurecimento, provocando uma pressa na aquisição de uma imagem que possa documentar uma propriedade de identidade. Percebemos que, diante do desamparo da contemporaneidade, o ferrolho procurado tem sido uma capa frágil de arrogância: a posse de bens ou de uma ideologia que beira ao fanatismo. Há um alívio da angústia em vislumbrar a solidão natural do amadurecimento quando acontece a inserção em grupos cujo ingresso é feito através da ostentação de patrimônio ou mediante a militância cega em torno de uma aparente causa.
Foto: Reprodução
         Jovens adultos ocupados com o acúmulo de riqueza que lhes ofereça uma garantia de um envelhecimento tranqüilo, ansiosos em aparelhar-se para enfrentar um descarte humano, ferozes por defender ideias sem ouvir a complexidade do mundo. Tão apressados que amadurecem à força, como frutas de estufa: lindas, mas com uma vida sem gosto.
         Refletir sobre novas configurações familiares, novas maneiras de crescimento profissional, novas formas de aquisição de conhecimento é fundamental para estarmos abertos aos caminhos de escolha sobre o modo de viver conquistados nesse milênio. Porém, questionar o que pretendemos manter a partir do legado transmitido pelos antepassados sobre o conceito de respeito ao outro é necessário revisitar; a fim de que a arrogância soe como um alarme quando ela defende sem proteger um humano frágil diante da possibilidade de uma vida que ainda não fez sentido para quem ela pertence.
         A vida de cada pessoa não necessita ter utilidade para o outro, mas consistência no prazer em estar vivo: algo muito mais complexo do que a satisfação de necessidades que se descarregam de maneira rápida. A aptidão para perceber o prazer em viver acontece quando a maturidade ingressa num sujeito adulto que não se assujeita a vestir uma capa de arrogância para esconder a sua fragilidade e decide encarar de frente o fato de que o que o torna humano não é uma vitimização, mas a humildade diante da sua existência singular.
Simone Engbrecht- psicanalista

Postagens mais visitadas deste blog

O Antigo na Inovação

A Madrasta Da Branca De Neve Foi Naturalizada Como Alguém Que Envelhece

A Finitude o o Envelhecimento