Renovar e inovar
A Páscoa possui o significado de renovação. Re novar, possui um prefixo de origem
latina interessante, com sentidos associados à repetição, ao retorno e ao
retrocesso. A fim de renovarmos, necessitamos retornar de novo para trás, a fim
de seguir em frente e inovar. A inovação traz a ideia de criatividade, de algo
nunca antes visto. Para renovarmos, mantemos algo antigo em sua essência, mas
sem repeti-lo. Já quem inova, não copia
ninguém.
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A
obediência cega ao antigo pode ser perigosa. Em psicanálise, a repetição foi
uma temática que atravessou a obra freudiana, sendo responsável pela abertura
de complexidade diante de uma teoria em construção. Em 1920, a compulsão a
repetir foi nomeada como a expressão da pulsão
de morte[i],
observando nos humanos uma tendência inata a repetir, antes mesmo de localizar
o que é bom ou ruim e muito aquém da diferença entre bem e mal.
O
amadurecimento não está, portanto, postulado simplesmente pela passagem do
tempo, mas desenvolvido pela autonomia adquirida diante de uma herança de
tradição. Observar uma história, e não uma linearidade de acontecimentos,
resulta numa leitura sobre qual é o bem a ser herdado. Sendo bem aqui não uma propriedade concreta,
mas a condensação do contrário de mal. Reafirmar uma escolha é não obedecer a
uma conduta como consequência à compulsão a repetir.
Renovar
significa obter autonomia pelas atitudes escolhidas a partir da responsabilidade
pela ambivalência e pelas dúvidas. Quem não põe em questão qualquer laço
amoroso por causa de uma obediência simples ao passado pode torná-lo um nó. Celebrações
em datas onde os antepassados cultivaram uma história com marcas são
tradicionais. Porém, a fim de não se tornarem um fanatismo, cabem restaurar o
sentido do que foi herdado a fim de que não se apague a vida presente pela
passagem do tempo. Muitas celebrações transforma-se em comércio por tornarem
uma tradição uma obediência ao invólucro de festa, um fanatismo que torna
alguém presa fácil de um consumo, uma compulsão.
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Quando uma
experiência ou um motivo parecem justificar em obviedade nossas escolhas,
podemos estar repetindo de maneira mortífera o passado e apenas dando a vida
uma aparência de nova, sem podermos, de fato, ser inovadores. Isso é, sem
conseguirmos nos responsabilizar por aquilo que nos torna únicos, as nossas
escolhas individuais quando refletimos e nos renovamos. É necessário muita
atenção com grupos que seduzem a nossa participação com o intuito de abdicarmos
de nossa individualidade.
Simone Engbrecht - psicanalista