Envelhecer não é adoecer
Com as possibilidades abertas por novas tecnologias, a nossa
relação com o nosso corpo precisa ser repensada. Hoje, comparado a cinqüenta
anos atrás, há uma diferença mais clara entre envelhecer e adoecer, pois o
processo de envelhecimento não apenas tornou-se mais longo, porém e
principalmente, com melhores opções para lidarmos com limitações.
Foto: Reprodução |
Tomar acontecimentos concretos da vida para torná-los
responsáveis pelo que fazemos com nossa existência é um caminho simplificador e
que arrasa com o conceito de subjetividade. Não é raro isso ocorrer, quando
alguém busca encobrir alguma angústia provocada por outras fontes, na qual
possui potência de escolha, por um
motivo/limite no qual não pode fazer nada. A vitimização e a paralisia são
refúgios utilizados quando há uma resistência a inovação.
Fernanda Montenegro- Revista Veja/Abril |
Nos inspiramos em uma frase
atribuída a Fernanda Montenegro: “A
nossa sociedade vê a mulher na menopausa como apenas um instrumento de
finitude”. Afirmar, por exemplo, que mulheres tem sintomas da menopausa
consiste em qualificar um período de vida como doença. O fato do ingresso das
mulheres no espaço público abriu caminho para que não apenas elas se questionem
sobre a sua objetalização, mas interroguem a todos, independente do gênero,
sobre o que a sociedade pode fazer ou abusar do envelhecimento do corpo. Um
corpo que não reproduz mais não é o de um ser doente ou em vias de extinção,
mas uma ‘casa’ que pode ser cuidada e escutada em suas limitações pelo ser maduro
que nela habita.
Um ser maduro e não doente é um ser inovador em 2019.
Vivemos em um momento em que mais claramente muitas pessoas podem atravessar os
90 anos: isso é novo. No entanto, é inovador, pois a posição de maturidade e
sabedoria com a qual essas pessoas lidam com a vida pode ser inquietante quando
percebem que o tempo desgastou o seu corpo, mas a sua essência é cada vez mais
livre de enganos. Os maduros inovadores tem a condição de possibilidade[i]
de poetas como os cegos, podem ver na
escuridão[ii].
Simone Engbrecht - psicanalista
[i]
Condição de possibilidade- termo utilizado por Michael Foucault, antropólogo,
nos anos 70.
[ii]
Trecho do poema de Chico Buarque.