Onde estamos
Tempos sombrios. O tempo nos situa a partir de parâmetros de
reconhecimento diante de qualquer percepção. Porém, a fim de nos situarmos no
espaço necessitamos diferenciar fronteiras e direções. Uma bússola ou um mapa
não mostram apenas onde estamos, mas nos apresenta onde está o Norte, onde está
o Oriente, onde está o outro... Diante das incertezas reveladas pela Pandemia,
precisamos abandonar o desejo de nos situarmos no tempo a partir de falsas previsões de futuro, mas nos
reencontrarmos no espaço em relação aos
humanos.
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A concepção de que resistimos à
mudança foi, ao longo da obra freudiana, uma abertura cada vez mais radical a
considerar que uma compulsão a repetir nos aprisiona, principalmente se o
que está além do umbigo não for considerado. Nos descentrarmos do nosso barco
pode nos situar na tempestade. De outro lado, reafirmando que estamos todos no
mesmo barco nos faz acreditar que todos irão se salvar ou afundar juntos, na
ilusão de que não há desigualdades. Esse não parece ser o alicerce da ética,
mas o eixo do argumento que conta com o outro como um objeto de uso. Perceber o semelhante implica respeitarmos diferenças
sem reforçar desigualdades.
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Estamos
no mesmo planeta com um vírus capaz de atingir a todos, porém, em lugares diferentes.
Considerar o outro nesse momento é muito mais do que cuidar para não contrair
ou transmitir Covid 19, mas é ocupar-se com uma contribuição para esse momento,
onde o egoísmo a manter aparências e a solidariedade de quem possui um recheio
existencial ficam muito iluminados por relâmpagos. Essa tempestade irá passar, desejamos
que o movimento dos ventos e das águas possa fertilizar mudanças mais profundas
do que novas versões de antigas crueldades. Portanto, sejamos radicais no
reconhecimento de nossas resistências, sem culpa, mas com responsabilidade pela
mudança que nos faz coerentes com um tempo que não volta para trás.
Simone
Engbrecht -
psicanalista