Competição ou Repetição

Desde a competição admirada em jogos infantis e em eventos esportivos até os desafios individuais em sempre acreditar que devemos ser melhores do que fomos no passado, alimentamos um ideal de conquista, avaliação e desempenho. A expressão ‘tá pago’ é utilizada como referência à pessoa não ter pago a dívida consigo mesma em ter realizado exercícios físicos aos quais se propôs.

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Repetindo para competir ou competindo para repetir? O núcleo comum entre esses dois termos se reflete em petere do latim, representado por pedir[i], marca um enlace também com o paradigma presente em cada uma dessas ações. A repetição é um conceito que inquietou Sigmund Freud desde o início de suas pesquisas. ‘Por que alguém repete ações sem muitas vezes ter consciência do que está retornando’ abriu caminho para a descoberta da transferência e da resistência como fenômenos clínicos. Até que a compulsão à repetição formulou a tendência humana a retornar a um estado anterior, a pulsão de morte.
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Repetimos para treinar e aprender, porém também para automatizar ações. Competimos para vencer, porém também para unir e brincar. Paradoxos presentes na nossa agressividade. Há uma frase moralista: o importante não é vencer, mas participar. A proposta desse texto não é essa, não é criticar a competição, mas refletir sobre a finalidade dela dentro de nós. O pensamento que compara e que julga nos auxilia a obtermos parâmetros, pontos de referência para nos situarmos. Porém, ao nos situarmos no mundo, cabe observar que os caminhos não são pistas de corrida e,na maioria das vezes, eles nem foram trilhados.

 A diferença entre uma saída lúdica e uma violenta está na possibilidade da vida ir mais além de uma finalidade avaliativa ou competitiva. As inovações acontecem quando há um prazer em criar e não em chegar antes ou em primeiro lugar. Refletimos muito sobre nós quando observamos as experiências vividas diante de cada limite encontrado. Um limite pode ser uma perda, um demarcador de território, uma frustração, um fracasso.  Porém, o limite mais implacável da vida é o tempo.  Ela não repete, não retorna. Podemos ser mais velozes e precisos do que éramos no passado, entretanto o que importa é o que fazemos com o tempo de vida enquanto estamos na caminhada. É tempo de travessia.

Simone Engbrecht - psicanalista  


[i] Estudo da palavra através da pesquisa de Benjamin Veschi, fundador e autor do site Etimologia.com.br.

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